Acórdão nº 01898/14.0BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução04 de Dezembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por B……….., S.A., visando a revogação da sentença de 30-05-2018, do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação intentada, na qual peticionava a anulação do despacho de 26-06-2014 do Diretor da Unidade dos Grandes Contribuintes, no âmbito da reclamação graciosa nº 3247201404000935 relativo ao acto de liquidação de IVA de 2011.

Inconformado, nas suas alegações, formulou o recorrente B…………., SA.

as seguintes conclusões, já devidamente aperfeiçoadas, após convite para o efeito: “1ª O presente recurso vem deduzido contra a sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o despacho de indeferimento proferido pelo Senhor Diretor da Unidade dos Grandes Contribuintes, datado de 26.06.2014, no âmbito da reclamação graciosa n.° 3247201404000935 relativo ao ato de autoliquidação de IVA de 2011; 2.ª O Tribunal recorrido considerou que a inclusão da componente de capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de locação financeira no valor das operações para efeitos de cálculo do pro-rata de dedução em sede de IVA encerra uma distorção na tributação atenta a circunstância de apenas a variante dos juros e outros encargos constituir contrapartida dos custos de financiamento e de gestão de contratos; 3.ª Tal consideração decorre dos entendimentos vertidos no acórdão do TJUE, proferido no processo C-183/13, em 10.07.2014 e nos acórdãos do STA proferidos no âmbito dos processos n.° 01075/13, datado de 29.10.2014, n.° 081/13, datado de 17.06.2015, n.° 0956/13, datado de 03.06.2015, entre outros; 4.ª No caso sub judice, o Tribunal a quo considerou que é legalmente inadmissível a inclusão do montante do capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de locação financeira no valor das operações para efeitos de cálculo do pro rata de dedução em sede de IVA, embora não seja possível extrair esta conclusão do aludido acórdão do TJUE de 10.07.2014; 5.ª Do acórdão do TJUE — e, por conseguinte, dos mencionados acórdãos do STA proferidos no âmbito processo n.° 01075/13, datado de 29.10.2014, n.° 081/13, datado de 17.06.2015, n.° 0956/13, datado de 03.06.2015, entre outros —, não é possível extrair a conclusão de que o artigo 23.° do Código do IVA e artigo 173.° da Diretiva 2006/112/CE (anterior artigo 17.°, n.° 5, da Sexta Diretiva do IVA) devem ser interpretados no sentido de se encontrar excluída do cálculo do pro-rata de dedução a componente de capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de locação financeira; 6.ª Dúvidas não subsistem de que o alcance da decisão do TJUE — e, por conseguinte, dos acórdãos do STA — se circunscreve à aferição da possibilidade de, à luz do artigo 17.º, n.° 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Diretiva, a administração tributária poder obrigar um sujeito passivo à exclusão da componente de capital das rendas faturadas no âmbito dos contratos de locação financeira para efeitos de cálculo do pro-rata de dedução; 7.ª É entendimento do TJUE que os Estados-Membros poderão afastar o método do pro rata geral de dedução e determinar a aplicação da afetação real dos bens e serviços a montante às operações a jusante, prevista no artigo 17.°, n.° 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Diretiva do IVA, com recurso a critérios objetivos com vista a determinar o grau de utilização dos inputs; 8.ª É certo que o TJUE julgou admissível a exclusão da componente de capital das rendas dos contratos de locação financeira do pro-rata de dedução, mas não é menos certo que este fez depender essa exclusão da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira, e não à atividade de disponibilização dos veículos, o que caberia ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, recaindo essa obrigação sobre qualquer órgão jurisdicional que pretenda aplicar o entendimento daquele acórdão do TJUE (cf. decorre dos considerandos 33 a 35 do acórdão do TJUE); 9.ª No entendimento do TJUE é necessária a evidência de que há distorção na tributação o que se faz através da demonstração da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira, o que, no caso em apreço e como demonstrado, não sucedeu; 10.ª Resulta evidente que sobre o Tribunal a quo recaía a obrigação de pronúncia sobre a verificação da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira, como, aliás, parece de resto ter entendido o STA, no acórdão proferido no processo n.° 1075/13, em que decidiu baixar os autos ao tribunal de 1.ª instância para a pronúncia sobre as questões que ficaram prejudicadas pela decisão; 11.ª No caso sub judice, a verificação da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento ou à gestão dos contratos de locação financeira não é concretamente aferida pelo Tribunal recorrido como o deveria ter sido; 12.ª No que respeita aos montantes das operações incluídas no cálculo do pro-rata, nem a Diretiva, nem o Código do IVA estabeleceram qualquer restrição, exceção ou segregação dos mesmos, não podendo concluir-se senão pela inclusão da integralidade montantes que constituem o volume de negócios; 13.ª Não compete ao intérprete abalar a natureza unitária da contraprestação e distinguir o capital do juro e considerar, para efeitos do cálculo do pro-rata, que somente o valor dos juros e dos encargos referentes às rendas dos contratos de locação financeira devem ser relevados (neste sentido vai a supra citada doutrina de JOSÉ MARIA MONTENEGRO); 14.ª Resulta evidente que se impõe a verificação da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento ou à gestão dos contratos de locação financeira (neste sentido que vai o acórdão do STA, proferido em 27.01.2016, no processo n.° 0331/14); 15.ª Tanto o legislador europeu, como o legislador nacional, cientes das alegadas distorções que o pro rata poderia gerar, poderiam ter determinado expressamente que, não obstante a sujeição da totalidade da renda a IVA, só o respetivo juro seria considerado no pro rata — o que não o fizeram; 16.ª Nesta medida, se o TJUE julgou por necessária verificação casuística, é porque a mesma não decorre da natureza dos contratos, mas das circunstâncias concretas de cada caso; 17.ª Se não fosse necessária essa verificação em concreto, bastaria ao TJUE afirmar como princípio que a componente de capital nunca poderia estar incluída para efeitos de cálculo do pro rata de dedução, pelo que, não o tendo feito, foi porque se impunha sempre a verificação em concreto da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento ou à gestão dos contratos de locação financeira; 18.ª A verificação da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento ou à gestão dos contratos de locação financeira não é concretamente aferida pelo Tribunal recorrido no caso sub judice; 19.ª A interpretação que o Tribunal a quo concede ao artigo 174°, n.° 1, da Diretiva 2006/112/CE (Diretiva do IVA), viola quer o princípio da tutela jurisdicional efetiva (cf. artigo 20.°, n.° 5, da CRP), quer os princípios da atribuição da subsidiariedade e da proporcionalidade e da cooperação leal entre a União Europeia e os Estados; 20.ª Demonstra-se a violação do princípio do inquisitório pelo Tribunal a quo, porquanto inexistem quaisquer elementos nos autos que permitam ao Tribunal a quo a concluir que essa ligação existe, pelo que, estando em causa um contencioso de mera anulação, tal só pode conduzir, no caso sub judice e à luz dos elementos de prova constantes dos autos, à declaração de ilegalidade do ato tributário sub judice por falta de prova da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira; 21.ª Ainda que se entenda que se impõe a produção da prova da ligação dos bens e serviços de utilização mista ao financiamento e à gestão dos contratos de locação financeira nos presentes autos, sempre se impunha ao Tribunal, ao invés do decidido na sentença recorrida, à luz do princípio do inquisitório, que promovesse pela realização das diligências necessárias e disponíveis para obter essa prova, designadamente notificando a parte para a junção dos elementos que reputasse necessários; 22.ª Sendo certo que sobre as partes recai o ónus da prova quanto aos factos necessários para fazer valer a sua pretensão, é igualmente certo que o Tribunal a quo detém um papel ativo na descoberta da verdade material, sendo-lhe imputável a não realização de diligências necessárias e disponíveis para alcançar esse objetivo; 23.ª Estando na disponibilidade do Tribunal a requisição de documentos, só lhe é lícito concluir pela falta de prova de um determinado facto se da aludida requisição dos documentos não decorrer a prova desse facto; 24.ª A esta conclusão não obsta as regras do ónus da prova estatuídas no artigo 74.° da LGT, na medida em que o princípio do inquisitório funciona a montante das regras do ónus da prova; 25.ª Admitindo-se que de acordo com o entendimento do Tribunal ad quem não constam do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão proferida e que permitam a esse Ilustre Tribunal a prolação de decisão sobre esta questão, sempre se impõe no caso sub judice que os autos baixem à 1.ª instância para a ampliação da matéria de facto, face aos já mencionado artigo 662.° do CPC (anterior artigo 711° do CPC), aplicável ex vi artigo 2.° do CPPT; 26.ª Demonstra-se a existência de erro de julgamento na interpretação e aplicação do artigo 23°, n.° 3 do Código do IVA, porquanto ficou demonstrado que não estão verificados os requisitos legais de que depende a aplicação do método da afetação real; 27.ª Sendo certo que o acórdão do TJUE autoriza os Estados-Membros a aplicar o método de afetação real em casos como o...

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