Acórdão nº 0412/20.3BEPNF de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução14 de Outubro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1– Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por A………………, melhor sinalizado nos autos, visando a revogação da sentença de 05-08-2020, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que julgou improcedente a reclamação intentada contra a decisão de indeferimento tácito do pedido que dirigiu ao Chefe do Serviço de Finanças de Valongo 2-Ermesinde em 28/02/2020, no sentido da extinção das dívidas exequendas por força da decisão de concessão da exoneração do passivo restante, proferida em 14/11/2018, no âmbito do processo de insolvência n.º 188/13.0TBVLG.

Inconformado, nas suas alegações, formulou o recorrente A……………….

as seguintes conclusões:

  1. Por via do presente recurso, pretende o Recorrente provar o desacerto e injustiça da sentença proferida nos presentes autos que, violando de forma flagrante o disposto no artigo 3º, nº 2 da Lei Geral Tributária e 245º, nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante abreviadamente designado por “CIRE”), decidiu que as taxas de portagem e respectivos juros de mora representam verdadeiros tributos e, por esse motivo, não estão abrangidos pela exoneração do passivo restante, nos termos do artigo 245º, nº 2, al. d) do CIRE.

  2. Sucede que, as taxas de portagens cobradas e respectivos juros de mora, pelo facto de não reverterem a favor de “entidades públicas” não são tributos. Pois que, nos termos do disposto no artigo 3º, nº 2, da LGT “(o)s tributos compreendem os impostos, incluindo os aduaneiros e especiais e outras espécies tributárias criadas por lei, designadamente as taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas”.

  3. Através do contrato de concessão, o Estado cede o uso do bem público (autoestradas) para as concessionárias, para que explorem por sua conta e risco e por um determinado prazo.

  4. Há uma aplicação de capital privado na execução da actividade concessionada, sendo que esse investimento acaba amortizado, principalmente pelas taxas cobradas directamente ao utente desses eixos viários.

  5. O Estado mantendo a propriedade do bem público, transfere para o domínio privado, a prestação do serviço, relacionando-se o concessionário directamente com o utente AMARAL, Freitas do, Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, Coimbra, pp. 294 ss.

    , posto que o Estado lhe outorgou contratualmente poderes para agir por sua conta.

  6. Pelo contrato de concessão são atribuídos à concessionária, poderes prerrogativas e deveres de autoridade, típicos dos atributos do Estado, nomeadamente de aplicar taxas de portagem, mas que revertem integralmente para si e não para o Estado.

  7. O próprio Tribunal a quo reconhece que as concessionárias recebem como contrapartida do Estado, desde logo, a receita das taxas de portagem cobradas aos utentes das autoestradas concessionadas – Cfr. página 17, 1º parágrafo da sentença recorrida.

  8. As portagens são a contrapartida pecuniária paga pelo utente pela utilização da autoestrada, pela faculdade que proporciona ao utente de utilizar um bem público, no âmbito de uma relação jurídica privada, onde o Estado não é parte – não tendo, por isso, natureza tributária.

  9. O mesmo entendimento é extensível aos juros de mora devidos pelo não pagamento da taxa de portagem, em conformidade com o artigo 561º do CC, dada a sua acessoriedade à obrigação principal, portanto na dependência da taxa de portagem SOUSA, Rui Pereira de, Contratos de Concessão, perspectiva económica, financeira e contabilística, Áreas, Lisboa, pp. 63 ss.

    .

  10. Desta forma, as taxas de portagem e seus juros, os custos administrativos, e os seus encargos fazem parte do activo do concessionário, constituem uma receita deste, um benefício económico que o mesmo usufrui por permitir a circulação de viaturas dos utentes nos eixos viários, sobre os quais possui exclusividade, com maior segurança e rapidez Acórdão TRG, proc. 1749/14.GTBVCT-B.G1, de 02/05/2016, disponível em www.dgsi.pt.

    .

  11. Do exposto decorre que as taxas de portagem não se subsumem ao conceito de imposto, e, embora se integrem na definição de taxa, a mesma não é devida a qualquer entidade pública, posto que as concessionárias das autoestradas são sociedades anónimas de direito privado – Cfr. neste sentido Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 22.03.2018, processo nº 853/17.3T8OLH-A.E1, relator Maria da Graça Araújo, disponível em www.dgsi.pt.

  12. A acrescer, os Acórdãos identificados pela sentença recorrida não trataram de situação análoga à dos presentes autos, não sendo, por esse motivo, aplicáveis.

  13. No Acórdão do Tribunal Constitucional nº 640/95, datado de 15/11/1995 estava em causa taxas de portagens da Ponte 25 de Abril, cujo produto da cobrança das portagens revertia para a Junta Autónoma das Estradas, constituindo receita própria deste organismo personalizado da Administração directa do Estado.

  14. Como se pode ler num dos trechos do aludido acórdão: “uma pessoa colectiva de direito público, como é a JAE (crf. o artigo 1º do Decreto-Lei 184/78, de 18 de Julho, diploma que aprova a orgânica deste serviço público), tem o direito conferido por lei, de cobrar uma contraprestação pela utilização desse bem do domínio público, através da passagem em veículo automóvel, bem como a de cobrar outras contraprestações por serviços conexos com a exploração económica da travessia da ponte”.

  15. O Acórdão do STA de 30/04/2019, processo nº 01021/12.6BEAVR 0102/18 remete a sua fundamentação para o aludido acórdão do Tribunal Constitucional nº 640/95, datado de 15/11/1995 que, como vimos, não trata de situação análoga à dos presentes autos.

  16. Os Acórdãos do Tribunal de Conflitos supra identificados determinaram a competência dos tribunais administrativos em razão da matéria para julgar julgar os litígios numa acção onde se pede a condenação de uma concessionária de autoestrada no pagamento de uma determinada quantia a título indemnizatório, na sequência de um acidente de viação.

  17. Face ao exposto, e atenta a matéria de facto dada como provada, nomeadamente o facto d) da sentença recorrida, deve a reclamação ser julgada totalmente procedente, revogando-se, consequentemente, a sentença em crise, substituindo-a por outra que declare extintos os créditos comuns aqui em causa, nos termos do artigo 245º, nº 1 do CIRE, com as demais consequências legais.

    Termos em que, deve a sentença recorrida ser revogada, substituindo-se por outra que julgue procedente a reclamação judicial apresentada, declarando extintos os créditos comuns aqui em causa, nos termos do artigo 245º, nº 1 do CIRE.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, no seguinte parecer: “1. OBJETO DO RECURSO.

    O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Penafiel que julgou improcedente a reclamação apresentada contra o ato de indeferimento do pedido de extinção da execução fiscal, em razão da declaração de exoneração do passivo restante, proferida no processo de insolvência do executado (proc. nº 188/13.0TBVLG).

    O Recorrente insurge-se contra o assim decidido, invocando que o tribunal “a quo” violou o disposto nos artigos 3º, nº 2, da LGT, e 245º, nº1, do CIRE.

    Para o efeito alega que respeitando a dívida exequenda a taxas de portagens e como estas não revertem a favor de entidades públicas, mas antes constituem receita do concessionário, não são consideradas tributos.

    Entende, assim, que se impõe a revogação da sentença recorrida e a sua substituição por decisão que declare extintos os créditos que fazem parte da dívida exequenda, nos termos do artigo 245º, nº1, do CIRE, com as demais consequências legais.

    1. FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA.

      2.1. Na sentença recorrida deu-se como assente que o aqui Recorrente foi declarado insolvente por sentença proferida em 16/01/2013, tendo em...

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