Acórdão nº 0530/19.0BELRA de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução13 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por A……….., S.A.

, com os sinais dos autos, visando a revogação do despacho de 08-05-2020, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou parcialmente procedente o recurso da decisão de aplicação da coima nos processos de contraordenação 13842017060000093949, 13842017060000093973, 13842017060000093957, 13842017060000093990, 13842017060000093981, 13842017060000093892, 13842017060000093965 [530/19.0.2BELRA] e 13842017060000093906 [531/19.9BELRA], fixando, em cúmulo material, a coima única de € 211.651,08.

Não se conformando, nas suas alegações, formulou a recorrente A……….., S.A.

as seguintes conclusões: A) – Nas decisões de fixação das coimas nos processos n.ºs 13842017060000093949, 13842017060000093973, 13842017060000093957, 13842017060000093990, 13842017060000093981, 13842017060000093892, 13842017060000093965 não estão fundamentados os critérios que contribuíram para o agravamento das coimas acima do limite mínimo da moldura contraordenacional.

  1. – O critério da “Frequência da Prática” não se encontra fundamentado com factos que evidenciam a prática frequente de infrações anteriores, o critério do “Tempo decorrido desde a prática da infração” não está elencado no art.º 27º do RGIT como relevante para graduação da medida da coima e porque é irrelevante e inócuo para o agravamento da coima acima do limite mínimo e ainda porque, embora conste das decisões a “Situação Económica e Financeira” da recorrente como baixa, tal critério não foi devidamente valorado para efeitos de fixação das coimas pelo limite mínimo da moldura contraordenacional C) – Verifica-se a nulidade insuprível das decisões que aplicam coimas nos PCO n.ºs 13842017060000093949, 13842017060000093973, 13842017060000093957, 13842017060000093990, 13842017060000093981, 13842017060000093892, 13842017060000093965, nos termos do disposto nos artigos 63º, n.º 1 d) e 79º, n.º 1 c) do RGIT.

  2. – Os artigos 25º e 26º do RGIT têm a sua razão de ser e não podem aplicados separadamente, nomeadamente há que atender aos limites do n.º 1 do art.º 26º quando se trate de aplicar o cúmulo às decisões de fixação de coimas em concurso.

  3. – O artigo 26º, n.º 1 ao definir os limites máximos das coimas aplicáveis às sociedades limita a possibilidade de se poder aplicar coimas a uma mesma entidade sem um teto máximo de punição.

  4. – À semelhança do regime da prescrição, o legislador pretendeu limitar a possibilidade de eternizar e cumular indefinidamente o montante máximo da punição das sociedades, assegurar, deste modo, a certeza e a segurança jurídicas enquanto princípios corolários do Princípio do Estado de Direito, plasmado no art.º 2º da Constituição da República Portuguesa.

  5. – A interpretação conjugada dos artigos 25º e 26º do RGIT não pode ser no sentido que permita que a punição máxima da arguida pessoa coletiva exceda os limites aí previstos quando estejamos perante várias infrações em concurso.

  6. – Do teor dos autos de notícia extrai-se que todas as condutas punidas resultam de factos apurados em inspeção tributária que abrangeu vários períodos de tributação e que integram uma atuação contínua e constante no tempo (dedução de IVA liquidado em aquisições), daí que a conduta em si mesma é una e contínua, com início no período 2014 03 e até ao período 2015 09, pelo que, a culpa e a gravidade da mesma deve ser avaliada e punida como uma única conduta.

  7. – Pelo que haverá que considerar a prática de apenas uma única contraordenação e, consequentemente, limitar a punição ao limite máximo previsto no n.º 1 do art.º 26º.

  8. – Acresce ainda referir que a aplicação do artigo 25º do RGIT às contraordenações tributárias em concurso determinou que as condutas isoladamente ganhassem uma gravidade exponencial que efetivamente não se verifica e a sua punição individualizada não permite alcançar a visão de conjunto em que as condutas estão integradas.

  9. – Assim, a não consideração do limite máximo de € 45.000,00, e a fixação de uma coima única que resulta da soma aritmética das várias punições não é proporcional à culpa da ora recorrente.

  10. – A fixação de uma coima única que excede a “justa medida” é, portanto, desproporcionada, por excesso, em relação aos fins que se pretendem atingir com a norma punitiva.

  11. – A finalidade da punição contraordenacional das infrações tributárias é advertir o agente pelo desrespeito de determinadas imposições legais e “anular” o benefício económico que o agente obteve com a prática da infração.

  12. – Nessa medida, e estando em causa nos autos infrações por falta de entrega da prestação tributária é essencial apreciar e valorar se a arguida entregou ao Estado as prestações tributárias em falta, com as devidas compensações pelo atraso na entrega.

  13. – De facto, a assim não ser a punição é abstratamente igual para o infrator que entregou a prestação tributária em falta e para aquele que não a entregou, que, deste modo, viola o princípio da igualdade.

  14. – Assim, a decisão recorrida padece de erro de julgamento de facto e de direito ao não valorar o efetivo benefício económico obtido, nomeadamente não conter os factos atinentes à regularização das prestações tributárias em falta.

  15. – Assim, a decisão recorrida ao fixar uma coima única em cúmulo material sem atender aos limites máximos previsto no artigo 26º do RGIT, afigura-se ilegal por violação dos princípios da certeza e a segurança jurídicas enquanto corolários do Princípio do Estado de Direito, plasmado no art.º 2º da Constituição da República Portuguesa, e o princípio da culpa, na vertente da desproporcionalidade face à conduta continuada.

Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser anulada a douta sentença recorrida.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, com os seguintes fundamentos: “1 – A……….., S.A. vem recorrer da douta sentença proferida nos autos que julgou parcialmente procedente o recurso da Decisão de Aplicação de Coima por si deduzido e na parte em que a decisão lhe é desfavorável. Decisão com que se não conforma.

Para tanto, alega nos termos conclusivos que constam de fls. , e, em síntese, entende que a decisão “a quo” peca por de erro de julgamento quanto à aplicação do direito, impondo-se a sua anulação e isto porque não se mostram fundamentados os critérios que contribuíram para o agravamento das coimas aplicadas; a fixação de uma pena única que resulta da soma aritmética das várias punições não é proporcional à culpa da recorrente, sendo tal fixação da pena única desproporcionada por excesso; mostrar-se violado o disposto no artigo 26º do RGIT ao fixar uma coima única, por violação dos princípios da certeza e segurança jurídicos (artigo 2º da CRP) e o princípio da culpa por desproporcional face à conduta continuada. Pede, a final, a revogação da decisão na parte afectada pelo presente recurso.

2 – Não houve Resposta.

3 – Da análise da matéria controvertida entendemos que o presente recurso deverá improceder.

De facto, face ao conteúdo dos autos, nomeadamente dos pontos assentes no probatório, que não foi questionado, por outro caminho não era de enveredar.

A douta decisão recorrida mostra-se, quanto a nós, correcta. Fez correcta interpretação dos factos e correcta se mostra a sua subsunção jurídica, mostrando-se devidamente fundamentada, não padecendo de qualquer vício de falta de fundamentação, e apoiada em pertinente jurisprudência e doutrina que, a propósito, cita, não sendo passível de quaisquer censuras.

O montante da coima aplicada resulta do cúmulo jurídico operado, pois as sanções aplicadas às contra-ordenações em concurso são sempre objecto de cúmulo material nos termos que decorrem do artigo 25º do RGIT.

Como vem salientado em anotação ao artigo 25º do RGIT, na 4ª ed., de Jorge L. de Sousa e Manuel Simas Santos, a págs. 291: “No regime de cúmulo material, a coima única a aplicar é a soma das coimas aplicadas a cada uma das contra-ordenações, não havendo lugar a qualquer redução.

A aplicação da regra do cúmulo material no âmbito das contra-ordenações tributárias, reconduzindo-se a um agravamento da coima global a aplicar pelo concurso em comparação com a cumulação de contra-ordenações comuns, justificar-se-á, eventualmente, pela importância fundamental para o funcionamento das instituições públicas que têm os créditos fiscais e as fortes razões de prevenção geral que a amplitude e frequência da prática de contra-ordenações tributárias faz sobressair.

Para fixar a coima única é necessário fixar, em primeiro lugar, as coimas concretas que seriam de aplicar a cada uma das infracções em concurso e, depois, somar todas as coimas, sendo a coima única a que resulta da soma de todas elas.

Estando a regra do cúmulo material expressamente estabelecida na redacção inicial deste art. 25º do RGIT e na introduzida da Lei do Orçamento para 2011 não há uma lacuna de regulamentação sobre a forma de efectuar o cúmulo das coimas, pelo que não há suporte para fazer apelo ao RGCO, pois este diploma, como legislação subsidiária que é (art. 3º, alínea b), do RGIT), apenas é de aplicação em matérias em que o RGIT não contenha normas próprias.” Ver no mesmo sentido o AC. deste STA, uniformizador de jurisprudência, nº 2/08, de 28.05.2008, no processo nº 78/08.

4 – Emite-se, assim, parecer no sentido da improcedência do presente recurso com a manutenção da decisão recorrida nos seus precisos termos.” * Os autos vêm à conferência satisfeitos os vistos legais.

* 2. FUNDAMENTAÇÃO: 2.1. - Dos Factos: Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão: 1.

Em 17.11.2017, foi levantado auto de notícia contra a Recorrente, do qual aqui se recolhe por excerto parte do seu teor, que é o seguinte...

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